O protagonismo do Brasil no ESG: Oportunidade para as empresas

O modelo de capitalismo que nos trouxe até aqui construiu uma série de avanços para toda a civilização e isso é inquestionável. Entretanto, no alvorecer do século XXI a sociedade está a se perguntar se esse modelo ainda se presta a funcionar daqui em diante.

Ao que parece a resposta é não! Em todos os cantos do mundo há uma busca por um modelo produtivo que além de lucro, entregue valor para as pessoas e preserve o planeta. E já temos uma solução que surgiu no início do século: o ESG!

A sigla vem se popularizando, mas já fez 20 anos de existência! Nasceu em 2004 por ocasião da publicação do documento Who Cares Wins. O documento foi criado por iniciativa do Pacto Global em parceria com várias instituições financeiras buscando integrar questões ambientais, sociais e de governança na análise financeira, gestão de ativos e corretagem de valores mobiliários. De 2005 a 2008 foram publicados outra série de documentos que estão disponíveis gratuitamente na internet e que explicam as questões relacionadas com o ESG:  Investing for Long-Term Value, Communicating ESG Value Drivers and the Company-Investor Interface, New Frontiers in Emerging Markets Investment e Future Proof? Embedding ESG issues in Investment Markets foram marcos inquestionáveis do ESG no mundo.

Apesar das variáveis de mercado, o ESG continua sendo um referencial importante no mundo dos investimentos e deve ganhar mais espaço como tendência. O fato novo é que ESG também pode ser implantado em pequenas e médias empresas. Inicialmente o leitor pode se surpreender, porque a cultura de então mostrava um ESG voltado para fundos de investimento e empresas de capital aberto. Mas isso mudou!

No ano de 2022 o Brasil ganhou um documento técnico publicado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, a ABNT PR2030 que trouxe diretrizes para orientar a implantação das práticas ESG.

É preciso reconhecer que a ABNT PR2030 foi fundamentada em vários outros frameworks e movimentos globais criados em torno das práticas de sustentabilidade. Posso citar o tripple bottom line, o Pacto Global, o Índice de Sustentabilidade Empresarial da B3, o Capitalismo Consciente, a Agenda 2030, o GRI, etc.

A PR2030 também trouxe uma definição do ESG como sendo um conjunto de critérios ambientais, sociais e de governança a serem considerados na avaliação de riscos, oportunidades e respectivos impactos, com o objetivo de nortear atividades, negócios e investimentos sustentáveis.

O documento vai além: propõe a construção de uma Jornada ESG.  Muitas empresas já promovem trabalho decente, agem em favor do meio ambiente ou possuem práticas de governança que favorecem a operação, mas estas mesmas empresas ainda não se apossaram da Jornada ESG para ampliar a magnitude da sua reputação.

O documento possui muitos méritos, mas um dos principais é apontar um conjunto de temas e critérios para as empresas organizarem a Jornada ESG. Isso porque muitos se faziam (e ainda se fazem) a pergunta: por onde começar a jornada ESG?

Os quadros a seguir mostram os eixos, temas e critérios que receberam recomendação para serem considerados pelas empresas para a jornada ESG:

Eixo: Governança Corporativa
Temas Critérios
Governança corporativa Estrutura e composição da governança
Propósito e estratégia sustentável
Conduta empresarial Compliance, programa de integridade e práticas anticorrupção
Práticas de combate à concorrência desleal (antitruste)
Engajamento das partes interessadas
Práticas de controle e gestão Gestão de riscos do negócio
Controles internos
Auditorias interna e externa
Ambiente legal e regulatório
Gestão da segurança da informação
Privacidade e dados pessoais
Transparência na gestão Relatórios ESG, de sustentabilidade e/ou relato integrado
Responsabilização (prestação de contas)

Fonte: ABNT PR 2030:ESG, 2022

 

Eixo: Meio ambiente
Temas Critérios
Mudanças Climáticas Mitigação de emissões de gases de efeito estufa
Adaptação às mudanças climáticas
Eficiência energética
Recursos hídricos Uso da água
Gestão de efluentes
Biodiversidade e serviços ecossistêmicos Conservação e uso sustentável da biodiversidade
Uso sustentável do solo
Economia circular e gestão de resíduos Gestão de resíduos
Economia circular
Gestão ambiental e prevenção da população Gestão ambiental
Prevenção da poluição sonora
Qualidade do ar
Gerenciamento de áreas contaminadas
Produtos perigosos

Fonte: ABNT PR 2030:ESG, 2022

 

Social
Temas Critérios
Diálogo social e desenvolvimento territorial Investimento social privado
Diálogo e engajamento
Impacto social
Direitos humanos Respeito aos direitos humanos
Combate ao trabalho forçado ou compulsório
Combate ao trabalho infantil
Diversidade, equidade e inclusão Políticas e práticas de diversidade e equidade
Cultura e promoção de inclusão
Relações e práticas de trabalhos Desenvolvimento profissional
Saúde e segurança ocupacional
Qualidade de vida
Liberdade de associação
Política de remuneração e benefícios
Promoção de responsabilidade e social na cadeia de valor Relação com consumidores e clientes
Relacionamento com fornecedores

Fonte: ABNT PR 2030:ESG, 2022

 

Após a publicação da PR2030 estamos diante de outros elementos que fortalecem ainda mais a necessidade da integração do ESG na estratégia de negócios: a iminência do projeto do mercado obrigatório de carbono no Brasil (e a materialização de uma economia de baixo carbono), a provável aprovação  da lei sobre economia circular, a obrigatoriedade da divulgação de informações financeiras relacionadas a sustentabilidade, o aprimoramento das regras de divulgação do Relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticos pelo Banco Central e o movimento internacional priorizando critérios de sustentabilidade nas relações comerciais são alguns fatores que testemunham a realidade.

Estamos apenas no começo de uma revolução. A PR2030 fortaleceu o ESG como uma estratégia financeira que agora está estruturada em um sistema de gestão.

As empresas no Brasil que souberem implantar sua Jornada ESG serão protagonistas desse novo capitalismo e certamente estarão na vanguarda da construção de riqueza sustentável.

 

 

Artigo escrito por Alberto Malta Junior, que é fundador da Empresa Office K-InTech, consultoria voltada para ESG e sustentabilidade. Mestre em Gestão de Tecnologia e Inovação, Especialista em ESG, Conselheiro Consultivo, escritor, mentor e professor.