Por trás das decisões judiciais que movimentam setores inteiros da economia, a perícia contábil tem ganhado bastante relevância. Em um cenário de disputas complexas, de valuation a dissoluções societárias, de fraudes a litígios tributários, a atividade ganhou visibilidade, rigor e novas demandas. Para a perita contábil Sandra Batista, integrante do Grupo de Estudos de Normas de Perícia do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e acadêmica da Academia de Ciências Contábeis do Distrito Federal, o momento é de consolidação, transformação e responsabilidade redobrada.
Ao analisar o mercado de perícias no Brasil, ela aponta que a perícia se tornou indispensável para dar segurança técnica às decisões judiciais. “A perícia consolidou-se como um instrumento essencial para o convencimento judicial, oferecendo ao magistrado segurança técnica e clareza para a tomada de decisão.”
Nos últimos anos, segundo Batista, o setor ganhou maior visibilidade e esse avanço foi impulsionado pelas mudanças no Código de Processo Civil, pelas recomendações do Conselho Nacional de Justiça e pela profissionalização dos cadastros de peritos nos Tribunais e no âmbito do Sistema Contábil CFC/CRCs.
Esse cenário, aliado à renovação contínua do conhecimento e à disseminação de boas práticas, tem contribuído para um mercado mais maduro e especializado. Mas há outros fatores que influenciam diretamente a atividade. Na visão dela, o dinamismo da economia e a evolução tecnológica impactam fortemente o trabalho pericial. “O uso massificado de novas tecnologias, a inteligência artificial generativa e a demanda por produtos técnicos de maior qualidade alteram as expectativas sobre o trabalho.”
Além disso, cresce a demanda por profissionais altamente qualificados diante de disputas tributárias complexas, litígios envolvendo equilíbrio econômico-financeiro, valuation, dissoluções societárias, operações de compra e venda de empresas, prestação de contas e fraudes. A perita vê um mercado mais exigente, diversificado e orientado por especialidades. “A complexidade dos conflitos contemporâneos exige defesas técnicas fortes, integridade ética e capacidade de traduzir dados em certeza, sempre em favor da verdade dos fatos.”
As tendências apontam para uma atuação mais integrada entre especialistas. De acordo com Batista, há uma tendência clara de atuação colaborativa, estruturada em complementariedade técnica para ampliar alcance, fortalecer capacidades e reduzir riscos. Segundo ela, peritos de diferentes áreas têm se unido em modelos de negócios estruturados com foco na entrega integral e na convergência de saberes. “Essa união busca acesso a mercados, diminuição de riscos e alcance de melhores resultados.”
Outro ponto central é a tecnologia, que se tornou protagonista como inteligência artificial, automação documental, leitura de grandes volumes de dados, cruzamento de bases públicas e privadas e ferramentas de rastreabilidade elevam o patamar da prova técnica. Apesar disso, ela alerta: “A ética, o conhecimento e as habilidades comportamentais permanecem como moedas de ouro, porque nenhuma tecnologia substitui a lucidez, o julgamento profissional e a capacidade de interpretar a realidade com precisão.”
O impacto é direto, na percepção de Batista o perito precisa dominar ferramentas, integrar métodos, aprimorar habilidades de comunicação, registrar seus procedimentos com mais rigor e sustentar, com clareza, cada etapa realizada. Para ela, dois elementos continuam sendo os maiores desafios: tempo e ética. “O mundo acelera e nos pede pressa, mas a perícia exige pausa intencional, estudo constante e paciência ativa, porque é assim que a competência floresce e a reputação se consolida.”
Ela reforça que a elaboração de um laudo é também um exercício ético: em um ambiente onde tudo corre, vence quem permanece íntegro, quem sustenta atitude, técnica, disciplina e foco. Quando falta tempo, surgem lacunas. Quando falta ética, surgem distorções, e o processo judicial sente ambos. “Nada é raso. Nada é rápido. Nada é descartável. Cada análise toca vidas que talvez nunca vejamos e influencia decisões que talvez nunca saibamos.”
Por isso, Batista conclui: “O perito deve cultivar um compromisso com a certeza técnica e responsabilidade, porque sua prova sustentará a confiança de todo um sistema que precisa de lucidez. A perícia funciona como um espelho. Ela não reflete achismos, reflete a integridade do ofício.”
A transparência na escolha do método e na justificativa dos critérios técnicos gera confiança e solidez profissional. Já a padronização, especialmente a prevista na NBC TP 01(R2), assegura consistência e rastreabilidade: Os procedimentos descritos registram o caminho percorrido até a conclusão e permitem que as partes compreendam a lógica e o resultado alcançado.
Para ela, a perícia deve ser ponte, nunca muro, pois quando a entrega é construída com transparência e padronização, o laudo cumpre seu propósito e se torna peça útil para a solução da controvérsia, contribuindo para a efetividade do processo judicial como um todo.




