Em meio às incertezas, José Fernando Fontes, sócio-diretor da De Martino, pontua que o empresariado ainda não internalizou totalmente os efeitos da reforma

A possível reformulação do sistema tributário brasileiro tem sido pauta de intensos debates há décadas. Desde as primeiras propostas, o objetivo sempre foi simplificar um arranjo múltiplo, complexo e altamente fragmentado, que onera a competitividade empresarial e limita a sustentabilidade fiscal do país. Com o avanço das discussões, especialmente na última década, o cenário parece mais próximo de uma implementação definitiva, embora o Brasil ainda esteja em uma fase de preparação e diagnóstico inicial.

Segundo José Fernando Fontes, sócio-diretor da De Martino, “os empresários, especialmente aqueles que serão diretamente impactados pela Reforma Tributária, já compreenderam a relevância do tema. No entanto, ainda não internalizaram de forma plena os seus efeitos sobre estratégias de precificação e decisões de investimento.” Ele explica que “esse cenário decorre do fato de que a Lei Complementar ainda não foi regulamentada, o que mantém em aberto pontos essenciais, em especial a definição da alíquota efetiva do IBS e da CBS e a forma exata de sua apuração. Sem esses elementos básicos, torna-se difícil para as empresas tomarem decisões concretas”.

O sódio diretor explica que no momento, o que se observa é uma etapa de preparação e diagnóstico inicial, em que as organizações buscam mapear seus processos e avaliar os possíveis impactos da fase de transição, prevista para iniciar em 2026. “Como contador, percebo que a principal preocupação do empresariado está na mensuração do impacto que a reforma poderá trazer sobre a carga tributária e na sua margem de lucro. Para tanto, temos realizado simulações com base em prováveis alíquotas do IBS e da CBS, a fim de fornecer parâmetros que ajudem as empresas a se antecipar e ajustar suas estratégias”.

Por outro lado, as incertezas normativas têm causado uma postura mais conservadora por parte das empresas. “A Reforma Tributária ainda está em fase de regulamentação, e muitos detalhes importantes ainda não foram definidos. Essa falta de clareza gera insegurança e faz com que empresários adotem uma postura mais cautelosa antes de investir, contratar ou expandir seus negócios”, afirma Fontes.

Entre os principais pontos de dúvida ele destaca:

Cálculo dos novos tributos (IBS e CBS): Ainda não está definido como as empresas deverão apurar esses impostos nem como poderão aproveitar créditos de tributos já pagos. Sem essa definição, fica difícil planejar corretamente os custos do negócio.

Percentuais de imposto (alíquotas): Não há informações claras sobre os valores que serão aplicados. Isso impede que empresários e contadores calculem com precisão o impacto sobre produtos e serviços.

Período de transição: Em 2026, o novo sistema tributário vai coexistir com o modelo atual. Isso pode gerar custos extras e afetar diretamente a margem de lucro das empresas.

Impactos para empresas do Simples Nacional: Micro e pequenas empresas ficam especialmente preocupadas. Para aquelas que têm clientes obrigados a recolher IBS e CBS, os créditos gerados podem ser pequenos, forçando o cálculo desses tributos fora da alíquota do Simples Nacional, podendo trazer um aumento significativos a sua carga tributária.

Por esses motivos, “muitos empresários estão agindo com cautela, planejando seus investimentos e decisões financeiras de forma mais conservadora, para evitar surpresas e riscos desnecessários”, reforça Fontes.

Para se preparar para a nova realidade, as companhias vêm adotando estratégias de otimização fiscal. Segundo ele, as empresas estão mais preocupadas em se preparar para as mudanças e evitar surpresas, entre as ações prioritárias, destacam-se:

  1. Revisar o regime de tributação: muitas empresas estão comparando se vale a pena continuar no Lucro Real, Presumido ou até no Simples, já que as novas regras podem mudar os cálculos.
  2. Aproveitar créditos e benefícios fiscais: a ideia é não “perder dinheiro”, ou seja, garantir que todos os créditos de impostos pagos em etapas anteriores sejam utilizados corretamente.
  3. Reorganizar operações e cadeia de fornecedores: como o imposto agora tende a ser cobrado no destino, algumas empresas estão repensando onde manter estoques, filiais ou centros de distribuição para reduzir custos.
  4. Usar tecnologia para apuração e compliance: sistemas de gestão fiscal estão sendo atualizados para acompanhar as novas regras, evitando erros e multas.
  5. Planejar a transição: como teremos um período em que o sistema antigo e o novo vão conviver, é importante simular cenários para entender como os impostos vão impactar preços, margens e investimentos.

Na prática, na visão de Fontes, os profissionais da contabilidade estão adaptando os serviços da seguinte forma: fazendo diagnósticos tributários personalizados, simulando o impacto da reforma em cada empresa; treinando e orientando clientes e equipes para que entendam as mudanças e consigam tomar decisões com segurança; usando ferramentas de simulação, que ajudam a visualizar a carga tributária em diferentes cenários; e acompanhando de perto a regulamentação para atualizar estratégias sempre que surgir uma nova regra.

Ele reforça que, neste momento, “o papel do contador é ajudar o empresário a se antecipar, mostrando de forma prática onde pode economizar, como evitar riscos e como se organizar para o futuro tributário que vem aí.”

No entanto, as dificuldades de transição e a insegurança jurídica podem prejudicar a competitividade brasileira no cenário internacional. Entre os principais riscos, José Fernando destaca: “Dificuldade de adaptação: o novo sistema de impostos (IBS e CBS) ainda está em fase de detalhamento. Até que tudo esteja claro, as empresas terão custos maiores para se adaptar. Travamento de créditos de impostos: muitas empresas podem demorar para recuperar valores pagos a mais em tributos, o que afeta o caixa e encarece seus produtos. Possível aumento de custos: dependendo do setor, a nova forma de cobrança pode elevar a carga de impostos e reduzir a margem de lucro. Investimento em tecnologia: será necessário modernizar sistemas e controles internos, o que pode ser caro, principalmente para pequenas e médias empresas. E insegurança jurídica: enquanto a lei não estiver totalmente definida, haverá espaço para interpretações diferentes, aumentando riscos de disputas com o fisco.”

 

Para minimizar esses riscos e manter a competitividade, o planejamento tributário estratégico se apresenta como uma ferramenta indispensável. Ele acredita que isso pode ajudar:
• Antecipando cenários: simular como os novos impostos vão impactar a empresa e ajustar preços e contratos desde já.

  • Organizando o aproveitamento de créditos: encontrar formas de recuperar impostos pagos mais rapidamente, evitando que o dinheiro fique parado.
  • Revisando a estrutura da empresa: avaliar se mudanças societárias ou operacionais podem reduzir a carga tributária.
  • Investindo em controle e gestão fiscal: adotar ferramentas que facilitem o cálculo e acompanhamento dos tributos.
  • Fortalecendo a conformidade (compliance): manter a empresa alinhada às novas regras para evitar multas e litígios.

Por fim, José Fernando reforça que o grande desafio está na transição para o novo modelo. “As empresas que se prepararem com planejamento terão mais chances de se manter competitivas no mercado internacional, mesmo diante das incertezas, do aumento de custos e da complexidade burocrática. Afinal, aqueles que se anteciparem e tiverem uma gestão eficiente poderão minimizar riscos, reduzir custos e aproveitar melhor as oportunidades que a reforma pode oferecer.”