A chegada da inteligência artificial (IA) vem promovendo uma revolução silenciosa, mas profunda, no setor da contabilidade. Desde os primórdios, essa prática sempre esteve ligada à tecnologia — laços que datam de 1494, quando Luca Pacioli, considerado o pai da contabilidade, criou uma técnica destinada a organizar o registro das transações comerciais. Para Alexandre Sanches Garcia, presidente da Academia Paulista de Contabilidade (APC), hoje, mais de cinco séculos depois, essa relação se aprofunda, com a IA representando a mais recente ferramenta capaz de ampliar a eficiência, reduzir custos e transformar o papel do profissional contábil. “A contabilidade é, no fundo, tecnologia”.
Segundo ele, a palavra ‘tecnologia’ tem raízes em estudo e técnica, reforçando que a contabilidade é o uso de uma técnica que evoluiu ao longo dos séculos, adotando máquinas, softwares e, agora, a inteligência artificial. “A IA é mais uma ferramenta tecnológica que veio para otimizar o trabalho do contador, assim como os sistemas integrados, os ERPs, fizeram no final do século passado”, explica.
Para Garcia, o avanço da tecnologia adaptou-se às necessidades da profissão. “A contabilidade foi se aproveitando dessas inovações, permitindo que atividades antes manuais e complexas fossem realizadas por máquinas e programas. Dessa forma, tarefas como conciliações e análises iniciais de dados, que demandavam muitas pessoas, hoje podem ser feitas de forma mais rápida e eficiente. A IA, portanto, é mais uma ferramenta de tecnologia de informação que o contador deve saber usar para apoiar seus serviços diários”, avalia.
No que diz respeito às decisões estratégicas das empresas, o presidente da APC ressalta que, embora a IA possa fornecer dados e sugestões, ela não substitui o julgamento humano. “A tomada de decisão envolve mais do que dados: exige discernimento e julgamento crítico,” compara. Ele explica que a tecnologia deve atuar como suporte, mas a palavra final continua a ser do profissional. Fazendo uma analogia, pondera que ninguém se sentiria confortável se uma cirurgia fosse feita apenas por robôs, sem intervenção humana. No setor contábil é a mesma coisa.
A questão ética também é central na discussão sobre o uso da IA. Garcia reforça que, para garantir a confiança, o uso dessas ferramentas deve ser responsável. “As empresas e escritórios de contabilidade precisam criar políticas internas de segurança, preferencialmente usando IA em ambientes fechados. O risco é de expor dados confidenciais de clientes, o que pode comprometer a reputação e a credibilidade. Portanto, a gestão ética, a transparência e o controle de acesso são essenciais para o uso adequado da tecnologia”, pondera.
Outra preocupação apontada por ele diz respeito aos limites da IA. “Ela é poderosa para processar dados e detectar padrões, mas não substitui a análise crítica do profissional,” afirma. Na visão dele, o contador deve validar os resultados e evitar que a tecnologia substitua o julgamento humano. Afinal, tarefas de interpretação, avaliação de riscos e aplicação de normas exigem discernimento que só um profissional qualificado pode oferecer.
Quanto às habilidades necessárias para o futuro, Garcia enfatiza que o profissional deve estar sempre estudando. “É fundamental ampliar conhecimentos, aprender a usar novas ferramentas digitais, interpretar dados e desenvolver soft skills como pensamento crítico e comunicação estratégica,” recomenda. Ele acredita que a resistência às mudanças é um obstáculo, e que o estudo contínuo é a melhor estratégia para se manter relevante nesse cenário de transformação.
Sobre o risco de desemprego em massa, ele é categórico: não há motivo para preocupação. “A automação de tarefas rotineiras deve diminuir oportunidades em trabalhos mecânicos, mas também abre espaço para atividades mais estratégicas e de maior valor. Ao longo da história, a tecnologia já reduziu a quantidade de profissionais envolvidos em tarefas repetitivas, mas também criou novas funções. Quem aproveitar essa evolução, adotando as ferramentas de IA e se capacitando, sairá na frente e continuará sendo valorizado,” afirma.
Para finalizar, Garcia reforça que a inovação deve ser vista como uma oportunidade de crescimento. “Quem entender a importância da tecnologia, usá-la de forma ética e integrá-la ao seu trabalho, certamente se distinguirá no mercado,” conclui. Ele aposta que a contabilidade do futuro será aquela que combina o melhor do julgamento humano com as vantagens da tecnologia, garantindo maior eficiência, segurança e valor para as empresas e seus profissionais.




